[US] AWA x DAZED 'gente, pessoa, humano'
Sept 4, 2024 23:36:31 GMT
Post by luis on Sept 4, 2024 23:36:31 GMT
Quem sabe demais não sabe de nada, só do coraçao. É uma das frases que dá nome e define o quarto álbum de AWA, que chega ao mundo exatamente daqui a nove dias (13/09). Quando se deparou com o encerramento da produção do disco, AWA soube que conhecia seu coração de ponta a ponta. Finalmente se sentia pronto pra voltar e falar alto pro mundo o que seu coração tanto guardava durante um longo tempo. AWA com certeza contou isso no disco, mas também contou pra DAZED. São muitas perguntas que precisavam ser respondidas antes que o "quem sabe demais não sabe de nada" viesse ao mundo. E entre elas, a principal:
"Afinal, quem é AWA?"
AWA é mais uma estrela num céu cheio de constelação que já está satisfeita com o seu lugar. Algumas estrelas esperam a vida toda pra se constelar, e outras sabem brilhar sozinhas no seu próprio espaço. Eu sou assim. Sou uma pessoa confiante, autêntica, que abriu mão totalmente de limites porque não combina mais comigo. Eu sou elu, ele, ela, enfim, estrela. AWA é um termo indígena usando por diversos grupos que significa "gente", "pessoa" e "humano". Com certeza não é meu nome atoa.
"Seu novo álbum é inspirado em A Hora da Estrela, da Clarice Lispector. Qual a relação desse livro com você?"
Eu sinto que conheci essa história num momento chave na minha vida. Teve um momento no final do ano passado em que eu não tinha mais muita confiança em mim. Não me sentia realmente bom, sentia que meu talento tinha uma chance altíssima de ser sorte de principiante. Será que era tudo ruim mesmo e meus amigos não tinham coragem pra me falar? Bom, os que não gostavam com certeza tinham a coragem. As pessoas são bem diretas de vez em quando e embora não tenha nada que eu respeite mais que isso, montou uma incógnita na minha cabeça que nem todos os prêmios do mundo conseguiriam tirar. Eu precisava mesmo da minha aprovação, não a dos outros e eu garanto que isso é muito, mas muito mais difícil de conseguir.
Quando conheci A Hora da Estrela, eu estava no mesmo lugar que a Macabéa, a protagonista da história. Sentia que a opinião das pessoas ao redor estava moldando demais o meu jeito de agir e de fazer arte. Tem um diálogo muito bonito do filme em que ela diz "Ah, eu não acho que sou muita gente. Eu ainda não tô acostumada. Será que eu sou mesmo eu?". E isso foi tudo que eu precisava ouvir pra começar meu processo de cura, que foi fazer esse álbum, e buscar o "eu" em mim de novo.
"Acha que seu álbum foi um processo de cura?"
Não acho, tenho certeza. Recuperei minha autoestima e minha artisticidade com esse álbum. Me permiti gritar, xingar, fazer coisas que eu nunca tinha feito durante esses quases 7 anos de carreira. Então quando eu falo que abri mão dos meus limites, foi literalmente em tudo. Não tem um limite sequer nessa minha era nova. Nem em mim, nem na minha arte. Eu gosto de falar que nós andamos juntos, na verdade. Meu álbuns com mais limites foram nas fases em que eu mais tinha também. Embora eu ame o "Marés" e tudo que ele trouxe pra mim, acho um álbum tão americanizado. Foi um limite dos grandes que eu quebrei e hoje eu não busco fazer um som de fácil absorção, mas um som que eu goste. E ponto final.
"O que quer dizer com fácil absorção? Bom mesmo é o complicado?"
Com certeza não. Até porque o complicado não é popular, então pop e complicado não podem andar juntos. Uma música boa é aquela que todos entendem mas que não debocha da nossa inteligência. Hoje em dia as músicas estão muito parecidas e eu não busco isso pra mim, pelo menos não mais. É uma frase clássica: o maior elogio que uma inovação pode receber é haver quem diga: "isso é óbvio, como não pensei nisso antes?". Significa que o seu "diferente" foi entendido e bem esclarecido. Não pode haver esse 8 ou 80, então eu sempre busco esse equilibrio pra minha carreira. Na verdade, sempre é uma palavra forte. Eu diria que do meu último álbum até agora.
"E como vai ser a recepção do seu álbum novo?"
Começou péssima (risos). Isso só o tempo diz. Ainda tem muitas surpresas, muita música, muito show, enfim... muita água pra rolar. Só sei que aqui em casa já é hit e a minha recepção foi um espaço enorme dentro do meu coração. Espero que conquiste um no coração de outras pessoas também. Há quem vá fazer uma careta bem feia e tirar na primeira música. Mas se eu já tô na chuva... agora eu quero me molhar. Posso adaptar a frase? Se eu já tô no céu... agora eu quero me brilhar (risos).
"Quanto entendeu que era uma pessoa não-binário?"
Eu comecei a me perceber a cerca de um ano, e depois que me divorciei, ficou ainda mais evidente pra mim o quanto eu me limitava pra caber dentro de uma relação em que eu não era muito bem... eu. Pra mim foi um processo mais de descoberta do que de definição. Havia algo em mim que não se encaixava nem no masculino nem no feminino de forma convencional. Eu nunca consegui cumprir muito bem o papel requisitado e enquanto homem gay isso era uma questão no meu casamento. Porque por muitas vezes meu ex-marido queria se sentir casado com um homem, afinal ele é um homem gay, mas eu nunca soube isso de interpretar um personagem. Que personagem? Não sei fazer isso, nunca soube.
Foi como se eu tivesse navegando por um mar de possibilidades, explorando diferentes identidades e entendendo, pouco a pouco, que minha verdadeira essência não estava restrita a nenhuma dessas divisões. Eu pesquisei, escutei outras histórias e refleti bastante sobre minha própria experiência, até que eu encontrei um espaço que ressoava com minha autenticidade – um espaço onde eu poderia ser plenamente eu, sem nenhum tipo de limitação ou expectativa. Liberdade é tudo pra mim nessa vida. Eu preciso ser livre pra conseguir viver, e acho que ser não-binário é o auge da liberdade que a gente pode alcançar na vida. Eu sinto que encontrei a chave pra uma porta que sempre esteve ali, mas que eu ainda não tinha descoberto, porque não queriam que eu descobrisse. Eu mesmo me impedi de descobrir várias e várias vezes. Essa jornada toda com o "quem sabe demais não sabe de nada" me permitiu abraçar minha identidade com um senso de paz que eu nunca tinha conhecido antes na vida. E eu tive a sorte de conhecer ainda nessa vida. Nunca é tarde.
"Se não fosse nessa vida, seria na próxima?"
Não sei (risos). Sei lá, vai saber quem eu era na vida passada. Eu era homem, mulher, casada, tinha filhos ou não? E vai saber quem eu vou ser na próxima? Prefiro gastar mais do meu tempo pensando nisso, porque acho que sei bem quem eu sou nessa vida agora. A gente tá sempre descobrindo, claro, mas me sinto num ponto de equilíbrio. E antes que venham me derrubar de novo, porque eu sei que vão, eu preciso lançar esse disco no mundo e fazer dele o meu marco temporal. Se eu vou me identificar com ele daqui a dez anos? Espero que não. Mas espero olhar pra trás, escutar ele e pensar "Que época linda. Nada, absolutamente nada podia me parar ali". É um tipo de pensamento bonito demais pra se ter quando lembrar da juventude e é o tipo de pensamento que as pessoas mais felizes tem. Eu quero estar nesse grupo de pessoas daqui a dez anos, com certeza.
"O que você diria pro AWA de dez anos atrás, então?"
Nunca ande de cabeça baixa. Não sofra com as despedidas, porque alguém quando parte é porque outro alguém vai chegar. Nunca faça com que sintam pena ou medo de você. Pare de tentar entender a vida. Fica com quem te faz bem. Você é muito linda. E não se esqueça de ser uma estrela. Sua hora vai chegar.
Nunca ande de cabeça baixa. Não sofra com as despedidas, porque alguém quando parte é porque outro alguém vai chegar. Nunca faça com que sintam pena ou medo de você. Pare de tentar entender a vida. Fica com quem te faz bem. Você é muito linda. E não se esqueça de ser uma estrela. Sua hora vai chegar.
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[Divulgação pra Vampiro]