[US] SOFÍA X ROLLING STONE
Jul 1, 2023 19:00:24 GMT
Post by adrian on Jul 1, 2023 19:00:24 GMT
A música é um veículo de discursos, sentimentos e narrativas carregado de interações sejam elas positivas ou não. Entendo a indústria musical como um obstáculo a ser superado, apesar de estarmos todos inseridos nele. Por indústria entendo aqui todo um sistema no qual o poder está nas mãos de homens de meia-idade, brancos e dopados de viagra e outros estimulantes sexuais. Logo, acredito que àqueles imersos nesse sistema e que são diretamente afetados por ele devam ser estimulados a lutar contra o status quo. Não é à toa que as principais críticas que recebo são desses que bebem da fonte de um sistema que privilegia uma cultura que se pretende “especializada”, quase sempre branca e localizada no dito “Norte Global”. Paciência, meus queridos! A mudança é lenta, gradual e repleta de hipocrisia. Neste editorial para a Rolling Stone, um veículo da mídia hegemônica e norte-americana, busco elucidar algumas das minhas principais bandeiras de modo que todas as contradições, ou boa parte destas, sejam colocadas à mostra. Sofía é o meu nome. E eu sou uma popstar. Mas... o que isso significa?
Sofía se destaca na mídia por seus discursos radicais antisistêmicas, mas não é hipocrisia uma artista que se diz contra um monte de “baboseira” genérica, como ela mesmo diz, se vender para esse mesmo sistema?
Não considero como hipocrisia, afinal, estou imersa em um mundo gerido e pensado como fórmula para oprimir. Não consigo, infelizmente, estar fora deste mundinho medíocre. Se estou dentro, a minha luta se dá internamente. Já parou pensar como deve ser difícil uma artista, seja ele de qual gênero musical for colocar a sua arte frente aos lucros? Vendemos a nossa força de trabalho para poder trabalhar, tornando-nos apenas meros operários sem vida, sem força e sem amor. Ou ao menos assim que nossos empregadores pensam. Em cada um de nós há uma fagulha a ser acessa pela indignação e pelo ódio de classe.
Músicas como Nada a Nadie, Berlín, Nochentera ou XT4S1S não são fugas de padrões musicais hegemônicos.
Em termos de ritmo ou de letra, não são inovadoras mesmo; mas a partir do momento em que torno este uma marca própria, de uma artista que possui alma e estética própria, o discurso assume outro caminho. Não quero e nem preciso reinventar a roda para fazer história.
Letras genéricas, ritmos batidos... uma artista com alma?
Uma coisa não deve se confundir com a outra. As letras e as batidas são apenas um fragmento da arte musical. A alma está dentro de tantas outras camadas que, se não for alvo da vontade dos críticos ou dos amantes da música, passarão despercebidos como o tempo que o Caleb Roth passa tuitando comentários infantis a meu respeito. Chato e ultrapassado.
Afinal, você compõe mesmo as suas letras?
Confesso que a grande maioria, não. Eu tinha vergonha de admitir isso, mas é isso aí. Não tenho talento para escrever belas canções. Todas foram adquiridas com acordo com os compositores em que meu nome estaria incluso na composição. Muito dinheiro foi investido nisso aí. E hoje o meu único arrependimento é o de ter obscurecido que não componho e não tenho vontade nenhuma de o fazer. Se algum dia eu lançar algo autoral será por que realmente quis e não por indignação fajuta de uns e outros. O mais engraçado disso tudo é que a letra não faz uma música, mas sim o artista que está por trás dele. Vocês já ouviram o MARÉS lançado pelo meu amigo AWA? Um álbum incrível, um dos melhores que já ouvi. As músicas autorais combinam com a construção de um homem delicado, de olhar açucarado e entende o seu poder e papel como artista. Outros sequer possuem isso. Então, estou de consciência limpa de que não ofendi ninguém, não desmoralizei ninguém.
Esse editorial foi pago e...
Sim. O editorial foi pago pela gravadora. E é por isso que estou ocupando quatro páginas da revista com textos e imagens. Isso se chama promoção. Próximo.
Sofía se destaca na mídia por seus discursos radicais antisistêmicas, mas não é hipocrisia uma artista que se diz contra um monte de “baboseira” genérica, como ela mesmo diz, se vender para esse mesmo sistema?
Não considero como hipocrisia, afinal, estou imersa em um mundo gerido e pensado como fórmula para oprimir. Não consigo, infelizmente, estar fora deste mundinho medíocre. Se estou dentro, a minha luta se dá internamente. Já parou pensar como deve ser difícil uma artista, seja ele de qual gênero musical for colocar a sua arte frente aos lucros? Vendemos a nossa força de trabalho para poder trabalhar, tornando-nos apenas meros operários sem vida, sem força e sem amor. Ou ao menos assim que nossos empregadores pensam. Em cada um de nós há uma fagulha a ser acessa pela indignação e pelo ódio de classe.
Músicas como Nada a Nadie, Berlín, Nochentera ou XT4S1S não são fugas de padrões musicais hegemônicos.
Em termos de ritmo ou de letra, não são inovadoras mesmo; mas a partir do momento em que torno este uma marca própria, de uma artista que possui alma e estética própria, o discurso assume outro caminho. Não quero e nem preciso reinventar a roda para fazer história.
Letras genéricas, ritmos batidos... uma artista com alma?
Uma coisa não deve se confundir com a outra. As letras e as batidas são apenas um fragmento da arte musical. A alma está dentro de tantas outras camadas que, se não for alvo da vontade dos críticos ou dos amantes da música, passarão despercebidos como o tempo que o Caleb Roth passa tuitando comentários infantis a meu respeito. Chato e ultrapassado.
Afinal, você compõe mesmo as suas letras?
Confesso que a grande maioria, não. Eu tinha vergonha de admitir isso, mas é isso aí. Não tenho talento para escrever belas canções. Todas foram adquiridas com acordo com os compositores em que meu nome estaria incluso na composição. Muito dinheiro foi investido nisso aí. E hoje o meu único arrependimento é o de ter obscurecido que não componho e não tenho vontade nenhuma de o fazer. Se algum dia eu lançar algo autoral será por que realmente quis e não por indignação fajuta de uns e outros. O mais engraçado disso tudo é que a letra não faz uma música, mas sim o artista que está por trás dele. Vocês já ouviram o MARÉS lançado pelo meu amigo AWA? Um álbum incrível, um dos melhores que já ouvi. As músicas autorais combinam com a construção de um homem delicado, de olhar açucarado e entende o seu poder e papel como artista. Outros sequer possuem isso. Então, estou de consciência limpa de que não ofendi ninguém, não desmoralizei ninguém.
Esse editorial foi pago e...
Sim. O editorial foi pago pela gravadora. E é por isso que estou ocupando quatro páginas da revista com textos e imagens. Isso se chama promoção. Próximo.
Sofía deveria enterrar a carreira e nunca mais aparecer na mídia.
Isso não vai acontecer. Ao menos não para sempre. Com o fim da DESENCANTO TOUR esta era findará e meu descanso também; não será completo, talvez – ou não – tenhamos projetos avulsos. Meus planos incluem terapia, leitura, terapia e aprender a fazer cerveja caseira para poder revender em alguma vila quase inabitada na Islândia.
E 4_20? Queremos single!
Vocês terão! Olha só que alegria. No fim deste mês a era será encerrada com o lançamento de meu último single, 4_20. Com direito a clipe e apresentação ao vivo para ninguém me perturbar enquanto estiver de férias.
Como um editorial pago pode ser lido como autêntico?
O como eu não sei, afinal, quem vai estar lendo é você; mas estou de coração aberto neste pequeno texto. Sou uma cantora que há anos está na ativa, mas preciso de descanso. Estar em constante movimento me cansa e me deixa pensativa a respeito de tudo aquilo que faço. Creio que novos artistas e bandas estarão ocupando os ouvidos daqueles que gostam de ouvir o que canto. Fui feliz por muito tempo, mas uma hora as coisas estremeceram e preciso de um tempo para reestabelecer o meu próprio eu. Um tempo para encontrar o meu destino, novas rotas.
E quanto tempo vai durar?
Eu não sei. O tempo que for necessário.
Só isso?
Só. Beijos! Brincadeira. Há uma última coisa que gostaria de dizer.
Sempre pensamos no que o outro vai gostar, vai pensar ou dizer sobre aquilo que fazemos ou deixamos de fazer. O nosso agir é condicionado por diversas questões ou óbices, mas sempre terá um sentimento, um fervor que acalma e dilacera os corações mais apaixonados e esperançosos. O digno é apenas uma questão de opinião. Dignidade é reconhecer-se, se perder e encontrar a si mesma no fim da estrada; com outra faceta, outras roupas, outro pensamento, mas a essência permanece. E é essa essência que ninguém pode tirar de você. Nunca. Um beijo. Com amor, Sofía!